sábado, 25 de dezembro de 2010

POEMA DE NATAL - Vinicius de Moraes


Para isso fomos feitos:


Para lembrar e ser lembrados


Para chorar e fazer chorar


Para enterrar os nossos mortos —


Por isso temos braços longos para os adeuses


Mãos para colher o que foi dado


Dedos para cavar a terra.


Assim será nossa vida:


Uma tarde sempre a esquecer


Uma estrela a se apagar na treva


Um caminho entre dois túmulos —


Por isso precisamos velar


Falar baixo, pisar leve, ver


A noite dormir em silêncio.


Não há muito o que dizer:


Uma canção sobre um berço


Um verso, talvez de amor


Uma prece por quem se vai —


Mas que essa hora não esqueça


E por ela os nossos corações


Se deixem, graves e simples.


Pois para isso fomos feitos:


Para a esperança no milagre


Para a participação da poesia


Para ver a face da morte —


De repente nunca mais esperaremos...


Hoje a noite é jovem; da morte, apenas


Nascemos, imensamente.



Vinicius de Moraes, poeta e diplomata na linha direta de Xangô. Saravá!
Extraído do livro "Antologia Poética", Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1960, pág. 147.

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